terça-feira, 25 de agosto de 2009

Conceito da loucura, panorama histórico do comportamento anormal.


Panorama Histórico do Comportamento Anormal

A sociedade explicou e tratou o comportamento anormal de diferentes maneiras em épocas diferentes; pois a maneira como uma sociedade particular reage à normalidade, depende dos seus valores e suposições sobre a vida e o comportamento humano. Isso por exemplo, em uma sociedade como a da Europa medieval, na qual o ponto de vista religioso foi predominante, a anormalidade era freqüentemente atribuída à causa sobrenaturais, como demônios e o tratamento envolvia preces e diversas formas de exorcismo. Assim na sociedade norte-americana, coloca muita fé na ciência e nos ”milagres da Medicina moderna”, pois não é surpreendente que o comportamento anormal seja considerado uma doença mental e seja com freqüência tratado como drogas.

Fases na História do Comportamento Anormal Pelo Conceito da Demonologia

A crença de que o comportamento anormal é causado por forças sobrenaturais que assumem o controle da mente ou do corpo, é anterior ao começo da história escrita; “evidência” na forma de rolos da papiros, monumentos e os antigos livros da Bíblia revelam que os antigos egípcios, árabes e hebreus acreditavam que o comportamento anormal eram decorrentes de possessão por forças sobrenaturais; como deuses irados, maus espíritos e demônios, pois não havia nada em comum em relação a estas culturas antigas atribuírem o comportamento anormal à ação de forças sobrenaturais porque elas acreditavam que muitos outros fenômenos, tais como incêndios, inundações, também seriam causados por forças sobrenaturais. Durante a idade média (500-1500 d.C.), a religião tornou-se a força dominante em virtualmente todos aspectos da vida européia e a abordagem de Hipócrates e seus seguidores foi essencialmente abandonada, pois a vida era percebida como uma luta entre força do bem e força do mal; sendo estas dirigidas pelo demônio que considerava-se, afligia as pessoas perturbadas. Por outro modo, a idéia antiga de possessão demoníaca foi revivida e tratamentos exorcistas brutais eram usados para expulsar o demônio; por exemplo, pessoas consideradas possuídas pelo demônio era apedrejadas ou torturadas de outros modos, mas o pior de tudo é que as pessoas perturbadas poderiam ser acusadas de ser agentes do demônio (não meramente suas vitimas) e por tanto eram rotuladas de bruxas. Pois por volta do fim da idade média, a política da igreja oficial ditava que as bruxas deviam ser identificadas e destruídas, no entanto para auxiliar nesta tarefa, foi publicado em 1846, um manual, o Malleus Maleficarum (O martelo das bruxas), para identificar e examinar bruxas. Este manual tornou-se uma autoridade e guia totalmente respeitado para a caça às bruxas, infelizmente para os mentalmente doentes; o manual igualava comportamento anormal com o possesso pelo demônio e supunha-se que os indivíduos possuídos fossem bruxas, para que o demônio fosse expulso, as bruxas teriam que ser mortas, e muitas vezes queimadas vivas. Nessa fase, período da demonologia o qual indivíduos mentalmente perturbados eram vistos como ameaças (perigos) para a sociedade e mortos em uma tentativa de proteger os outros; esta prática propagou-se para as colônias na América do Norte, onde às caças bruxa atingiu seu ápice na década de 90 dos anos 1600 com os famosos julgamentos de bruxaria de Salem.


Cultura Greco-Romana

O Conceito de Loucura entre os Gregos do Comportamento Anormal

Pela característica da opinião popular grega, acreditavam-se no sobrenatural como sendo a causa dos distúrbios mentais; supunha-se que as pessoas angustiadas estivessem possuídas por espíritos malignos, tais como as deusas Mania e Lissa, pois até, no entanto não havia disposições específicas asseguradas para o tratamento de doentes mentais. Escritos de Hipócrates (século a.C) constam a elaboração do conceito médico da loucura; esse teria fixada pela interação dos quatro humores corporais, sendo eles: sangue, bílis negra, bílis amarela e fleuma, ( Um dos quatro humores naturais, segundo os antigos. Frieza de ânimo; serenidade, impassibilidade e Falta de diligência.) – que resultavam da combinação de quatro qualidades básicas da natureza; calor, frio, umidade e aridez. Pois assim, as pessoas eram classificadas de acordo com quatro temperamentos correspondentes – sanguíneo, colérico, melancólico e fleumático; classificação essa considerada como indicativa da orientação emocional predominante. Pois o funcionamento da personalidade atingia nível ótimo ao ser alterado a crasis, ou seja, a interação perfeita das forças internas e externas; pois havia conflitos entre essas forças denominadas dycrasia que indicava a existência de excessivo humor corporal que deveria ser removido pela purgação. Hipócrates (460-355 a.C) constatava a visão predominante de que os distúrbios mentais, especialmente a epilepsia, tivessem origem divina e sagrada; mas com o tempo o pensamento grego começou-se a estabelecer distinções entre soma (corpo) e psique. Começou-se a considerar que os sonhos liberavam as pessoas de forças externas adversas e, mais tarde, que as libertavam dos obstáculos colocados por seus próprios corpos. Visto que a subdivisão da alma feita por Platão (428-348 a.C) em A República entre apetite, razão e têmpera foi comparada por muitos à divisão psicanalítica em id ego e superego. Sendo assim, as principais diferenças estariam em que o apetite, em contraste com o id, é plenamente consciente, e que o superego, mesmo que grandemente irracional e punitivo, não se limita às emoções. Dá explicação fisiológica segundo o conceito de Hipócrates, o comportamento anormal em termos de causas naturais, ao invés de sobrenaturais, ocorreu quando Hipócrates (460-377 d.C), conhecido como pai da medicina moderna, ensinou que o cérebro é o órgão responsável pelos transtornos mentais. Assim como vimos anteriormente, Hipócrates sugeriu que o comportamento era pelos níveis relativos de quatro humores (líquidos) no corpo: bílis negra, bile amarela, fleuma e sangue. Por exemplo, ele acreditava que um excesso de bile negra causava depressão, e que o excesso de bile amarela estava associado à tensão, ansiedade e instabilidade pessoal, que níveis elevados de fleuma resultavam em um temperamento sombrio ou preguiçoso (“fleumático”) e que em um excesso de volume sanguíneo estava relacionado a oscilações de humor rápidas. Mas Hipócrates carecia de técnicas científicas para verificar sua explicação, mas sua abordagem nos iniciou no caminho de ver o comportamento anormal como um mau funcionamento ou doença fisiológica e supriu a função para a perspectiva fisiológica sobre o comportamento anormal, no entanto o tratamento deste período envolveu tentativas de restaurar o equilíbrio apropriado entre os humores e isto foi geralmente feito drenando o excesso de líquidos do corpo ou alterando dieta, exercício, ingestão de álcool, ou estilo de vida em geral – uma vez que as pessoas perturbadas eram consideradas como sofrendo de doenças, eram cuidadas como as outras pessoas doentes.


O Conceito de Psicopatologia da Loucura (Comportamento Anormal)

A psicopatologia como disciplina científica separa da psiquiatria existe recentemente; o termo psicopatologia surgiu em 1878, como sinônimo de psiquiatria clínica, pois somente no início do século XX foi criado um método patológico para compreender a psicologia normal pelo estudo do fato patológico. Aqui está a primeira definição de uma metodologia e de um objeto de estudo próprios a essa área do saber onde o marco oficial ocorreu em 1913 com a publicação da obra Psicopatologia Geral do psiquiatra e fenomenólogo Karl Jaspers, nasceu aí a história da psicopatologia. Mas antes desse ramo da criação da ciência, o sofrimento psíquico já era objeto de reflexão e tratamento, -- suas origens referem à história do pensamento e da medicina. Referindo-se o psiquismo (psico), trata-se do termo grego psiqué que deriva de ] psykhein – soprar, respirar; significa sopro ou princípio vital, ou seja o mesmo que o termo latim anima, alma – o eu nos anima, nos dá vida. psiqué é a alma individual personificada e psíquico é o que diz respeito às ‘coisas da alma’. Esta disciplina trata assim do patológico referido ao anímico, que se diferencia e de certa maneira se opõe ao corpo somático. Quanto a patologia, recordamos que logia vem de logos – palavra que significa estudo, pensamento, razão e se refere à ciência ou estudo sobre algo, no caso, ciência dos fenômenos patológicos do psiquismos. E quanto ao prefixo de patologia? Páthos tem o sentido etimológico de passividade e sofrimento e é por isso que dizemos que o doente padece; porém páthos também é sinônimo de paixão e significa muito mais que doença. Pois em sua origem, esse termo se referia a tudo que afeta o corpo e a alma em um bom ou em um mau sentido, assim como a qualquer estado psíquico agitado por circunstâncias exteriores: por sentimentos agradáveis como amor, prazer, piedade ou negativos como pensar, aflição, tristeza, cólera, ódio ou dor. De acordo, antigamente não tinha o sentido de doença que hoje é evidente no termo patologia e foi concebido como um movimento, uma agitação que vem de fora – daí a noção de passividade. E é de mover (movimentar) que deriva o verbo comover e também a idéia de emoção (sentimento e afeto) que, assim sendo, têm tem estreita ligação com páthos. Ou seja, paixão é o movimento, alteração, mudança, agitação, recepção, emissão e, principalmente, passividade, pois o páthos só se inicia após receber um movimento que vem do exterior do psiquismo. Também se relaciona a emoção e a comoção; pois a emoção surge quando a alma está em movimento, constituindo o campo do sentir e comoção e é o sentimento originando por um movimento forte, violento. Páthos também é perturbação; no entanto não é à toa que se diz que o homem apaixonado fica perturbado, confuso. Temo aí a origem da oposição clássica da razão e paixão: a razão é a harmonia, medida, equilíbrio; a paixão é desmedida, desarmonia, confusão, perturbação, desrazão, loucura e doença, pois os seres humanos são racionais e passionais; em sua história – a do pensamento humano, procurou-se reduzir o psiquismo à sua parte racional e em função disso, a parte não racional acabou ligada ou doente porém com isso, não é preciso resumir o estudo do páthos a sua dimensão negativa. Visto que as manifestações ditas patológicas não se restringem ao desequilibrado ou à doença, ainda que páthos acentue uma idéia que incomoda: estar passivo, à mercê de algo. Talvez por isso está sujeito às emoções ou paixões seja considerado saudável. É a capacidade exclusivamente humana de ser racional que permitiria uma ação voluntária, ou seja, um ação que se origina em nós mesmo; ao contrária as ações involuntárias, aquelas que não determinamos, nos aproximam de outros seres vivos para os quais só existem movimentos do páthos opostos à razão e ligados ao corpo: instintos, apetites, impulsos, desejos, inclinações e sentimentos, pois o que nos diferencia dos animais, não seriam nossas emoções, mas sim a razão. É o qual é um dos motivos de se considerar o campo psicopatológico negativamente não por não valorizarmos nossa parte “animal”, “instintiva”, “irracional”, com isso se a paixão é desrazão e sofrimento, se há uma articulação interna entre paixão loucura e emoção, a história da psicopatologia deve abarcar o estudo que se refira ao não racional no homem. Pois quem pretende estudar o psiquismo ligado ao páthos, necessita a perguntar sobre os movimentos e alterações do mesmo sobre as suas relações com o mundo e com outros; as suas manifestações afetivas, perturbações, confusões e desmedidas, as suas maneiras de adoecer, os seus prazeres e sofrimentos e os seus desejos, impulsos, tendências e apetites. Portanto, a psicopatologia e a sua história constituem um campo vastíssimo que ultrapassa em muito a dimensão da doença mental. No livro sobre a História da Psicopatologia, de Hervé Beauchesne diz que a “psicopatologia supõe a existência de um fato patológico psíquico que merece ser estudado e isso é, conhecer o normal através do estudo do patológico – é uma diretriz que separa a psicopatologia de outras disciplinas, pois dela decorre que há um “patológico”no psiquismo não redutível ao organismo (medicina) ou ao ambiente (psicossociologia)”; apesar que essas teorias, o termo psicopatologia ainda é utilizado por alguns sinônimos de psiquiatria clínica; por vez os mesmos temas da psicopatologia de Psiquiatria Geral ou Psicologia Médica. Há quem diga que a psicopatologia e a psiquiatria partilham o mesmo campo, mas diferem em seus meios e finalidades: a primeira teria o objetivo de estudar o patológico e a segunda seria uma terapêutica do funcionamento mental, ou seja, a psicopatologia seria responsável pela teoria e a psiquiatria por aplicá-la. Outra distinção comum é encontrada em psico/logia e psico/pato/logia, pois uma estudaria o psiquismo “normal” e a outra trataria do seu adoecimento, mas atualmente a realidade é bem mais complexa; existem abordagens psiquiátricas puramente biológicas que negam quaisquer determinações psíquicas das patologias e por isso, consideram que não há por que existir uma psicopatologia. Nisso bastaria a Medicina e a Biologia para darem conta desse campo do saber. Declives da própria psicologia pensam o psiquismo de forma científico-positivista e consideram que este pode ser reduzido a explicações neurofisiológicas e assim, também questionam o sentido da disciplina que trata o patológico à dimensão psíquica. Ao contrário, Jaspers quando propõe os fundamentos da psicopatologia diz que seu objeto é o “homem todo em sua enfermidade” e que todo fenômeno psíquico que possamos apreender em conceitos de significação constante e com a possibilidade de comunicação faz parte da psicopatologia que ainda assim, sempre perderá aspectos essenciais do humano, pois “nunca é possível reduzir inteiramente o ser humano a conceitos psicopatológicos”. Situa-se a psicopatologia como disciplina científica, não-médica mergulhada na experiência íntima do sofrimento individual, mas preocupada em produzir proposições de caráter geral sobre o padecer psíquico. Nessa mesma vertente, Eugéne Minkowski considera que a psicopatologia deve estudar, descrever e compreender as estruturas fundamentais da presença humana sob sua forma mal sucedidas. Esse autor não delimita o fenômeno psicopatológico pelo seu caráter doentio, mas por constituir uma outra forma de ser. Já o psiquiatra Daniel Lagache, defende que a psicopatologia é uma escola inegável de psicologia concreta e viva insistindo na idéia de que o psicopatológico pode nos ensinar a respeito de si próprio e, sobretudo, sobre o psiquismo em geral e um dos idealizadores da psicopatologia fundamental, Pierre Fédida, psicanalista francês, a psicopatologia se refere hoje a uma encruzilhadas epistemológica entre disciplinas científicas heterogêneas que têm em comum a preocupação com o sofrimento psíquico e cujo objetivo é o fato pático. Mas qual é a diferença entre pático e patológico? A concepção pática é encontrada na tragédia grega e diz que a paixão (páthos) é um sofrimento que traz consigo a possibilidade de se transformar em sabedoria; pois a condição de tal transformação é que este sofrimento possa ser compartilhado, escutado por um outro que “sustente a palavra do sofredor até que ele atinja os extremos de autoengendramento de um sujeito”. Na tragédia teatral Agemenon, de Ésquilo, temos a afirmação de que Zeus deu aos homens essa lei: pathei mathos, ou seja, “sofrer para aprender”. Algo como uma permissão para que a sabedoria possa surgir do cerne do sofrimento humano. Pático se refere ao que é possível aprender na paixão, no sofrimento e na doença, enquanto que patológico destaca exclusivamente suas dimensões negativas; mas partindo de Jaspers da visão da psicanálise e da concepção pática, propõe o resgate da implicação subjetiva constituída do sofrimento psíquico e as perspectivas clínicas decorrentes. Mas para o psicopatólogo brasileiro Paulo Dalgalarrondo, a psicopatologia tem raízes na tradição médico-científica e na tradição humanista (filosofia, literatura, artes, e psicanálise) a partir da qual se pode reconhecer no patológico uma possibilidade enorme de conhecimento com dimensões humanas que seriam inacessíveis sem o fenômeno designado como “doença mental”. Pois a psicopatologia é uma ciência autônoma que não se confunde com a psiquiatria, a neurologia, psicologia ou com a psicanálise. De acordo com Paulo Dalgalarrondo, “a Psicopatologia exige uma atitude aberta despreconceituosa e multi-disciplinar”, mas vale a recusar alternativas exclusivistas sejam elas psicanalíticas, fenomenológicas, biológicas, cognitivo-comportamentais ou socioculturais e o conhecer o que há de útil e esclarecedor em cada uma delas. Dalgalarrondo lembra de que Freud descreveu muito bem o lugar da arte como fonte de conhecimento psicopatológico poetas e romancistas são os nossos preciosos aliados e seu testemunho deve ser altamente estimado; pois eles conhecem muitas coisas entre céu e a terra com que nossa sabedoria escolar não poderia sonhar, pois nossos mestres conhecem a psique porque se abeberaram em fontes que nós, homens comuns ainda não tornamos acessíveis à ciência”. Já para o psiquiatra brasileiro Carol Sonenreich tem uma visão oposta; segundo ele o conhecimento psicopatológico é fruto do trabalho de pesquisadores e cientistas e não de filósofos e humanista, entre esses ‘pesquisadores e cientistas’, em 1997, a médica americana Nancy Andreansen garantirá que o único objetivo de uma psicopatologia cientifica é identificar os mecanismos neurais dos processos cognitivos normais e compreender como são afetados nas doenças mentais, para ela ‘a mente é a expressão da atividade cerebral’. O método proposto é o de dividir a mente (aqui não cabe falar da psique ou da alma) em partes a serem investigadas tais como memória, linguagem, atenção etc e relacionar estas ‘partes’ a lesões cerebrais e o desenvolvimento neural, nisto a psicopatologia é o mesmo que a neuropsiquiatria ou psiquiatria biológica; no entanto outros consideram que o estudo nessa área deve se basear somente na tecnologia da radiologia, da ressonância magnética, da tomografia etc. Assim como na investigação neuroquímica do liquido céfalo-raquidiano, em testes endocrinológicos e na pesquisa dos neurotransmissores, pois a psicopatologia seria o campo de estudo e descrição dos sintomas psíquicos e suas relações com as estruturas e funções do cérebro a partir do uso dos recursos tecnológicos modernos; estas são declives conexas com as nosografias contemporâneas como a (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – versão 10 CID-10) e o (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – versão 4 DSM-IV); todas são classificações da OMS – Organização Mundial de Saúde que utilizam critérios considerados ateoricos, isto é, baseados somente na descrição e classificação de sintomas e síndromes.